Série Av. Paulista: As Histórias de Rothschild e Siciliano

Série Avenida Paulista: das casas de Rothschild e Siciliano ao Edifício Viking

A Série Avenida Paulista desta semana explora um fenômeno que teve início no começo do século passado. Muitas casas construídas nesse período pertenciam a investidores que as alugavam, e muitos deles também residiam na própria Paulista. Um exemplo notável é o de João Dente, que possuía casas para aluguel já mencionadas anteriormente nesta série.

Hoje, vamos nos aprofundar na história das casas de aluguel de Moritz Rothschild, que também viveu na Avenida Paulista. Essa narrativa foi extraída de uma magnífica tese de doutorado de Jorge Lody, realizada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.

Antes de iniciar a descrição das casas, observem a única imagem disponível delas. Notaram que são duas casas idênticas e geminadas? Assim como ocorre atualmente, havia regulamentações que determinavam como deveria ser a construção de casas, especialmente na Avenida Paulista, exigindo recuos nos quatro lados em relação ao limite do terreno. Em várias situações, os construtores tentavam contornar essas regras projetando casas simétricas e geminadas. Para conseguir a aprovação na Prefeitura, os projetos frequentemente incluíam portas de comunicação entre as casas que, na prática, não eram construídas. Um verdadeiro golpe de engenharia!

Essas casas, projetadas pelo arquiteto Carlos Ekman, obtiveram autorização da Prefeitura para construção em março de 1911. A planta das casas ilustra exatamente essa situação. Os retângulos brancos na planta indicam onde as portas de comunicação deveriam estar, mas não foram efetivamente construídas. Além disso, as casas não eram exatamente simétricas, outro indicativo de que se tratava de duas unidades distintas.

Apesar de um engenheiro da Prefeitura ter apontado essa inconsistência, o diretor Victor Freire autorizou a construção e solicitou a concessão do alvará e o pagamento dos impostos. No antigo sistema de numeração da Avenida, as casas eram identificadas pelos números 128 e 130. É provável que a construção tenha levado de dois a três anos, sendo posteriormente disponibilizadas para aluguel.

Sabemos que Moritz Rothschild vendeu e leiloou vários de seus imóveis para ajudar no esforço de guerra da Alemanha durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), o que resultou em sua inclusão em uma lista negra do governo brasileiro, impedindo-o de realizar qualquer atividade comercial no país. Em 1917, Rothschild teve que deixar o Brasil. Este fato pode ter motivado o anúncio de leilão da casa 128, publicado em 17 de dezembro de 1916, no Correio Paulistano, pelo leiloeiro Albino de Moraes. É bastante provável que até essa data, a casa estivesse alugada.

Em 1917, as casas já figuravam nas listas telefônicas, e ambas estavam registradas em nome de Heribaldo Siciliano, um importante personagem da história paulistana. No início de sua carreira, Siciliano foi engenheiro chefe das oficinas da Companhia Mecânica e Importadora de São Paulo e, posteriormente, diretor da seção de Construção, onde introduziu maquinaria moderna. Na época, era considerado um dos melhores arquitetos de São Paulo, recebendo a confiança de seu mentor, Ramos de Azevedo, para diversas construções. Siciliano teve vários investimentos e projetos na Avenida Paulista, incluindo a Vila Constança.

Em 1921, Heribaldo foi eleito vereador da Câmara Municipal de São Paulo e reeleito em várias legislaturas. Na Câmara, propôs soluções que foram convertidas em lei, como o Código de Obras e a reforma da pavimentação de paralelepípedo para asfalto, além do embelezamento da cidade. Ele também foi um dos fundadores do Instituto de Engenharia de São Paulo.

Em 18 de março de 1917, uma nova notícia destaca a autorização da Prefeitura para que Heribaldo, que já deveria ser o proprietário das casas na Avenida Paulista, realizasse modificações na guia de ambas. Seu nome aparece associado à casa 128 até meados dos anos 1920, o que sugere que ele tenha residido nela durante esse período, antes de colocá-la para aluguel. Heribaldo era sobrinho do Conde Alessandro Siciliano, que também morava na Avenida, no número 126.

Em 1933, Heribaldo fundou, com outros empresários, a Viação Aérea de São Paulo – VASP, da qual foi o primeiro presidente. Ele também teve um papel de destaque como presidente da Rádio Educadora de São Paulo, promovendo a boa música e os bons artistas, e foi um dos pilares da Orquestra Sinfônica de São Paulo. Casado com Dona Elvira de Queiroz Barros Siciliano, o casal teve dois filhos, Maria Alzira Siciliano e Lauro de Barros Siciliano, sendo que uma rua foi nomeada em sua homenagem no Jardim Bélgica, no distrito de São Lucas.

Retornando às casas da Paulista, a de número 128, a partir de 1927, começou a ser anunciada como disponível para aluguel. Em 1932, um anúncio indicava que estava para alugar “uma sala bem mobiliada independente e quarto modesto com garagem”. Curiosamente, essa garagem teria sido construída no fundo da casa.

Em 1938, a casa foi mencionada em uma matéria com o título “furtou a barata, mas foi preso”, referindo-se a um Chevrolet 478 de propriedade de Paulo Albino, morador da casa. A casa de número 130, por sua vez, provavelmente permaneceu alugada continuamente até ser vendida. Em janeiro de 1927, foi anunciada a compra pelo Sr. Jesuíno da Silva Campos por 140 mil réis. Em 1932, um anúncio fúnebre noticiou a morte de D. Margarida Magalhães Campos, esposa de Jesuíno, mencionando que ela teve diversos filhos, incluindo Flávio, que já aparecia na lista telefônica em 1930 como proprietário do endereço. O velório de D. Margarida ocorreu na Avenida Paulista, número 130.

Atualmente, neste local, encontra-se o Edifício Viking, situado na Avenida Paulista, número 777. Este prédio possui 18 andares com lajes a partir de 400 m² e conta com três elevadores sociais. No edifício, estão localizadas empresas como United Airlines, Lâmpadas Golden, Henkel São Paulo, ASK Academy e Schwarkopf Professional, além da Locus Business Center, que oferece escritórios virtuais, e a Unicharm do Brasil, fabricante das fraldas Mamypoko. No andar térreo, encontram-se lojas das operadoras de celular TIM e Claro, que acentuam a concorrência no 777 da Avenida Paulista.

Uma publicação no Facebook em 15 de setembro de 2016, reconta uma situação engraçada ocorrida no prédio: “Diboas trabalhando após o almoço e eis que começou a soar o alarme de incêndio do prédio, e logo a confirmação: ‘precisamos descer, não é simulação’… lá vamos todos nós descer os 14 andares de salto alto (no meu caso)… chegamos no térreo e vem mais um aviso: ‘podem subir novamente, era UM INDIVÍDUO FUMANDO (o que é proibido) no sétimo andar’… eu estou viva, mas minhas pernas NÃO… como diz meu amigo Michel… que vontade de dar um murro??”

Até a próxima semana!


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